É fácil falar de "Mamonas Assassinas". A banda paulista de um disco só tomou de assalto o cenário musical brasileiro nos anos de 95 e 96. Influentes e corajosos, ousaram enfrentar a tríade axé-pagode-sertanejo com bravura e letras irônicas. Ainda que haja boa vontade generalizada em transformar letras rasas em peças filosóficas e relembrar o carismático Dinho como um bom vocalista, o Mamonas Assassinas ficará sempre marcado mais pela quebra de paradigmas do que pela qualidade musical (prova disso são as raríssimas regravações de músicas da banda).
Antes do sucesso estrondoso do álbum homônimo lançado em junho de 95 houve o fracasso retumbante de "A Fórmula do Fracasso", quando a banda ainda se chamava "Utopia". Qual o motivo para um ser tão bem sucedido e outro tão desconhecido do grande público. Seria a numerologia? Seria o abraço total ao rock cômico (que, surpreenda-se com isso, começou com o antológico Falcão)? Ou talvez o nome novo fosse mais "comercial"? Suspeito que nenhuma das alternativas; a chave para entender o fracasso da Utopia e o sucesso dos Mamonas são três anos.
Saindo da turbulência das Diretas Já!, da redemocratização e enfrentando um traumático processo de impedimento do Presidente, o Brasil ainda respirava incertezas. O balanço entre o sério e o cômico do disco, as letras mal resolvidas e a situação econômica precária jogaram o disco da Utopia para os porões do insucesso. Três anos depois, a situação era outra.
Já tínhamos o Plano Real, um novo Presidente eleito e perspectivas de mudança. Era a hora do sossego, do respiro, era a hora de extravasar. Não cabiam mais os rocks soturnos de Renato e sua galera, não era o momento de embarcar em outra invasão britânica (apesar do espetacular "Nobody Else", do Take That e da obra-prima do Oasis em outubro). Não. 1995 era o ano em que os brasileiros escolheriam rir de si mesmos, adiar (por alguns anos) o início da avalanche politicamente correta e abraçar os Mamonas como válvula de escape das pressões dos últimos dez anos.
Se era bom? Pra época, desejos e necessidades de toda a população sim. Foi, acima de tudo, um disco e uma banda necessária para o Brasil. Muito mais necessária do que boa, é importante dizer.
Se fariam sucesso hoje, se não tivessem encontrado o trágico destino em março de 1996? Costumo opinar que não, embora respeite quem diz que sim, já que pareciam aptos a se reinventar. É um prazeroso exercício imaginar como os Mamonas encarariam a internet, as redes sociais e a geração Z. O inconsciente coletivo da época transmitirá, por gerações, a história dos Mamonas Assassinas, o furacão de oito meses.
E é bom que continue assim.